Como foi meu primeiro encontro com tradutores
Nem me lembro como soube do evento. Isso foi lá nos idos de mil novecentos e setenta e poucos e, naquele tempo, não tinha Internet nem nada dessas frescuras: divulgar um evento não era fácil. Mas eu soube e lá fui, num sábado de manhã, todo esperançoso, para conhecer meus colegas de profissão, porque era um evento patrocinado pela ABRATES, no prédio do que se chamava então Faculdade Iberoamericana, FIA, para os íntimos, que depois virou Unibero, foi comprada pelo Grupo Anhanguera. Agora, o prédio foi demolido. Era na Brigadeiro Luiz Antônio 871.
Chegando lá, topei com um bando de jovens, quase todos
alunos da Faculdade, que, animadíssimos, estavam procurando se integrar no
ambiente. Encontrei lá a Ivete, uma velha amiga que vou chamar de Ivete pelo
simples motivo de que ela não se chamava Ivete, se me faço claro. O diálogo foi
surreal.
—Danilo! Você aqui!
— Ivete! Que surpresa, menina!
— Que que você anda fazendo, Danilo?
Fiquei surpreso. Afinal de contas, aquilo era uma reunião de
tradutores, não de violinistas ou lá o que seja. Respondi o óbvio:
—Sou tradutor!
— Tá, aqui todos somos tradutores, até eu. Quero saber o que
você faz para viver. Eu, por exemplo, trabalho aqui na secretaria da Ibero.
— Uai, eu traduzo.
— Como, “eu traduzo”?
Estava começando a se formar uma rodinha à nossa volta. A
Ivete trabalhava na secretaria e era conhecida de muitos. E o fato de que eu
dizia que traduzia para viver, chamava atenção. Porque, ali, todos eram
bacharéis ou acadêmicos de tradução —mas ninguém traduzia para viver, pelo
simples motivo de que, neste país, não se podia viver de tradução — pensavam
eles.
— Eu traduzo, eu faço traduções, me pagam para isso e eu
vivo do que me pagam. Qual é o problema?
Enquanto pronunciava essas palavras,
para reforçar o sentido, com minhas mãos batuscrevia uma tradução
inexistente em uma máquina de escrever imaginária. Pra quê!
— Você traduz a máquina, Danilo? Mas isso é impossível.
Tradução, se faz à mão.
Enquanto pronunciava essas palavras, para reforçar o
sentido, com sua mão esquerda, traçou uma linha imaginária, que começava em seu
coração e seguia até a mão direita, onde uma caneta invisível garatujava uma
tradução imaginária em uma folha de papel inexistente.
No seguir da conversa, descobriram que eu trabalhava para
uma editora e que traduzia livros sobre contabilidade e finanças.
— Ah, Danilo, mas isso explica muita coisa! Você faz
tradução técnica! Se fosse literária, não dava. Não dava mesmo.
Essa foi a conversa com a Ivete. Merece uma análise, mas vou ficando por aqui. Já escrevi demais, por hoje e vou publicar a discussão daqui a um dia ou dois. Espero que você tenha
gostado do que leu e volte. Obrigado pela visita.
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