O dia em que chorei no Theatro Municipal de São Paulo
Estava no início de carreira e absolutamente deslumbrado com o fato de que um cliente, uma editora, elogiava muito meu trabalho, me dava serviço sem parar e me pressionava para não aceitar serviço de outros clientes.
A vida até que corria bem. Eu entregava um
livro, era pago ali, na hora, na boca do cofre e levava outro para casa para
traduzir. Era como se eu tivesse serviço “de carteira assinada”. Seguro,
tranquilo. Não se ganhava muito, mas era bem melhor do que eu ganhava como
professor na Fisk.
Um dia, a editora contratou um gerente
editorial que, simplesmente, não gostou nem de mim nem de minhas traduções.
Talvez ele até tivesse razão em não gostar do meu serviço, sei lá —no fim das
contas, há muito de subjetivo na tradução.
Mas o fato é que, quando entreguei o livro
que estava traduzindo, fui pago como combinado, mas não me deram nada para
traduzir. O dono da editora simplesmente me agradeceu e se despediu de mim.
Cheguei em casa arrasado. Setenta por cento
de meus rendimentos tinham se evaporado num instante. Me sentia perdido.
Naquela noite, minha mulher e eu, sem nada
para fazer, fomos ao Theatro Municipal de São Paulo, assistir a uma
apresentação grátis do pianista Fritz Jank e do Quarteto de Cordas Municipal de
São Paulo. Iam tocar, entre outras coisas, o Quarteto para Piano op. 60 de
Brahms, do qual ela e eu gostávamos muito.
Quando chegou ao Andante, que é o movimento
mais lento, não aguentei mais e comecei a chorar. Chorei durante o movimento
inteiro, para vergonha da pobre da minha mulher.
Mas desanuviei minha mente e, no dia seguinte
parti para a luta — nunca mais permitindo que qualquer cliente fosse
responsável por mais de 30% de minha carteira, que é o que recomendo a você
também.
Se quiser ouvir opus 60 de Brahms, clique aqui. O andante começa aos 15:45.
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