Chamaram você de turco?

A língua materna do motorista do táxi era claramente o árabe. Lá pelas tantas, me contou que era libanês. Coisa rara, um taxista libanês. Parecia ter alguma instrução e, no meio da conversa, no seu português arrevesado e cheio de construções francesas, me perguntou porque tantos brasileiros chamam os libaneses (e, aliás, todas as pessoas que falam árabe) de "turcos", quando eles não são turcos coisíssima nenhuma e as duas línguas são muito diferentes. Era algo que o incomodava, e não pouco.


Falantes de árabe normalmente são semitas e, do ponto de vista étnico, não têm nada que ver com os turcos, que de semitas não têm nada. Além disso, a língua turca, embora tenha algumas importações do árabe, relacionadas com fato de que os turcos se converteram ao islã, do ponto de vista estrutural e genético é totalmente diferente do árabe.


Turco, mesmo, de fato, é coisa rara no Brasil: o mais conhecido é o Ibrahim Eris, que foi presidente do Banco Central no tempo do Collor.


Mas o fato é que as primeiras pessoas de fala árabe que chegaram ao Brasil vieram do oriente médio, que, até 1918, fazia parte do Império Otomano e, portanto, eram súditos do imperador da Turquia e, portanto, vinham com passaportes turcos e, portanto pela terceira vez em seguida, legalmente, eram todos turcos.


Com o desmoronamento do império otomano, no fim da primeira guerra mundial, pouco a pouco países como o Líbano e a Síria adquiriram ou readquiriram sua própria identidade política e o pessoal que vem de lá para cá já não é legalmente turco — mas a tradição persiste, para desgosto de meu amigo taxista, que não morria de amores pelos turcos.

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